A construção de um sonho
“AVES DE FOGO”[1]
DO CÉU VEIO O RAIO
QUE DESTRUI O PARAÍSO
DO CHÃO RENASCEU A VIDA
QUE NO FOGO ARDIA
A CHAMA A QUEIMAR O SUOR DO DIA
BERROS A ROLAR
SÃO OS ESTALOS DE AGONIA
O CHEIRO DA LIDA A ESFARELAR
UMA BRASA A QUEIMAR
É O SUSPIRO DA VIDA
A CHANCE DE VOLTAR
O MOMENTO DE ENXERGAR
QUE:
TODOS DEVEM CAMINHAR
BOCAS A SOLUÇAR
NESTA VIDA TEMOS QUE LUTAR
TEMOS QUE NOS LEVANTAR
OLHANDO PARA FRENTE
CABEÇAS LÚCIDAS
PÉS NO CHÃO
E A TODOS UM SÓ CORAÇÃO.
O Ecoponto do Carmo é um
projeto idealizado e iniciado na administração do prefeito Edinho- PT, no ano
de 2002, no bairro do Carmo em Araraquara, situado próximo ao centro da cidade.
O
objetivo do projeto era criar um ponto de recepção de materiais recicláveis no
próprio bairro, e também reunir os catadores da região para trabalharem na
coleta seletiva na área de abrangência proposto. Inicialmente eram 6 pessoas,
que se reuniram informalmente e criaram a Associação Cidade Limpa, eles saiam
com seu bags pelas ruas do bairro para recolherem o material da população, e
depois revendiam aos atravessadores locais.
No
começo do projeto a situação de trabalho era muito precário, não havia apoio da
sociedade civil, de empresas locais, e do poder público. Com o tempo o material
coletado foi se acumulado, trazendo problemas para os próprios catadores e a
população vizinha, pois a presença de ratos e insetos era constante. Em meados
do ano de 2002, foi disponibilizado por uma Usina da região uma caminhonete,
com motorista e o abastecimento diário incluído, isto possibilitou que o
montante de material recolhido aumentasse, no entanto, mais material foi se
acumulando no terreno da Associação
Mais
pessoas foram sendo associadas para tentar diminuir a quantidade de lixo
acumulado, estavam em catorze pessoas, mas mesmo assim não conseguiam criar um
processo de trabalho capaz de solucionar o problema, o ganho mensal eram muito
baixo, pelo tanto de material que possuíam, existia também o desvio de material
pelos próprios catadores, principalmente o cobre e o alumínio, que possuem o
valor do Kg maior que os outros materiais.
Em
2003, depois de muitas tentativas de organização do pessoal, a Secretária
Municipal de Desenvolvimento Econômico, interveio, devido às várias denúncias
de irregularidades dos próprios catadores, e da vizinhança. Segundo o
secretário do desenvolvimento econômico de Araraquara Paulo Sérgio Sgobbi, a
atitude da Prefeitura em intervir era que o projeto deveria se auto-gerir,
portanto, era preciso resgatar os princípios para qual foi idealizado.
Durante
2 meses, eu como assistente e sociólogo da Secretaria, trabalhei durante todo o
expediente para administrar junto aos catadores o local, e tentar criar um
mínimo de processo de trabalho que inexistia, assim como o conhecimento dos
princípios autogestonários. Era responsável por auxiliar no resgate e na
padronização das rotinas de trabalho, fiquei responsável pela abertura e
fechamento do barracão, anotava tudo o que era recolhido de material na rua, o
que era vendido, e o quanto eram revertidos em dinheiro, no final do dia,
informava a todos os trabalhadores sobre a produção. A coordenação do Ecoponto
neste período ficou a cargo de duas associadas, escolhidas em eleição da qual
participaram 13 trabalhadores.
Muitos cooperados ficavam
bêbados e utilizam entorpecentes no local de trabalho, aos poucos isso foi
acabando, assim como os desvios de materiais. Alguns cooperados sabiam onde eu
morava e apareciam de manhã, à tarde ou à noite pedir algum conselho e
dinheiro, era uma situação muito complicada.
Aves
de Fogo surgiu de um poema que fiz no dia que entrei no Ecoponto e ele estava
em cinzas, foi no final de novembro de 2003, após um mês de recolhimento,
separação, e armazenamento, houve um incêndio misterioso, o local já estava
fechado, já era noite. Muitos associados acham que pode ter sido algum catador que
havia sido expulso da Associação devido à comprovação de desvio de material, ou
por usuários de drogas que segundo vizinhos, utilizam o local para usar e
traficar entorpecentes. Depois daquele dia, olhando nos olhos de cada um achei
que os cooperados iriam desistir do projeto, mas ocorreu o contrário, eles se
uniram ainda mais.
Foi
um período de muita experiência e desafios enfrentados, mas que com a
intervenção e por tudo que passaram, eles puderam aprender que com o trabalho
conjunto o resultado final é sempre melhor que o individual. E isso foi muito
importante para o desenvolvimento do Ecoponto, da Acácia e da coleta seletiva
na cidade.
Para
onde seguir?
No ano de 2004, começou com outra
perspectiva em suas vidas, devido ao projeto de implantação da coleta seletiva
solidária na cidade de Araraquara, o grupo de catadores da acácia, formada por
52 pessoas que ficavam na usina de lixo triando o material reciclável e o grupo
do ecoponto do carmo que ficava andando pelo bairro recolhendo material porta a
porta, se uniram dando origem ao primerio grupo de coleta seletiva na cidade
denominado Cooperativa de catadores de materiais recicláveis Acácia.
Conseguiram abranger cerca de 25% da cidade. Esta união foi muito positiva,
conseguiram formalizar a cooperativa na junta comercial, redigiram o estatuto e
o regimento interno, estabeleceram convênios com a prefeitura e com o
departamento de água e esgoto da cidade, e por fim conseguiram recursos do
Bndes.
Foi uma mudança muito grande para o
pequeno grupo de trabalhadores do carmo, tanto no trabalho como em suas vidas,
ressurgiram como a fênix, literalmente das cinzas, para ocuparem seus espaços
nesta sociedade tão desigual e desumana.
[1] Este
poema foi escrito por mim e dedicado a todas as pessoas da Associação Cidade
Limpa, ecoponto do Carmo, após o incêndio ocorrido em dezembro de 2003, no
barracão. Um incêndio nunca explicado que destruiu toda a produção mensal, de
recolhimento e separação do lixo, deixando em cinzas os sonhos de todos aquelas pessoas, mas que com o tempo foram se
levantando e construindo um novo sonho- tornar-se uma cooperativa.
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